Cidade Paraíso

Meu Paraíso:

Tem sol, adoro sol aquecendo a pele, mas não tem calor, é fresco, bem fresco.
Tem gente macia pra abraçar e encostar o rosto.
Tem livros bons (só os bons) e seus respectivos autores disponíveis para longas conversas num fim de tarde.
Tem gente inteligente, gentil e bem humorada, estas três características são fundamentais, mas só gente que não tem medo de ser o que se é, gente que tenta ser outra coisa é muito chato, e não tem.
Tem gente bonita, mas não do tipo de beleza que só fica bem em foto, tem que ficar bonito se mexendo também, sorriso bonito, olhar bonito, andar bonito, falar bonito.
Tem longos caminhos para percorrer com uma cachoeira bem fria no final.
Tem Internet. É, tem.
Tem outros lugares pra gente poder mudar de lugar quando precisar.
Tem mãe e comida de mãe.
Tem música boa, sempre ao vivo.
Tem muito açúcar.
Tem uma cama muitíssimo confortável com uma mini-tela de cinema na frente onde só passa filmes bons.
Às vezes algum autor, diretor ou roteirista vem para assistir o filme com a gente. Neste caso, e apenas neste caso, é permitido comentar durante o filme, apenas se o filme estiver sendo visto ao menos pela segunda vez, é claro.
Tem museus, muitos.
Tem alguns teatros, com poucas peças boas em cartaz.
Tem lindas noites longas e manhãs bem curtas.
Noites escuras.
Tem silêncio.

Paraíso

Toda terapia deveria começar pela pergunta: “Como é o seu paraíso?”.

À primeira tentativa de reclamação, o terapeuta interrompe e diz: “Meu querido, sem o paraíso não dá nem pra começar. Isso mesmo, pode ir.”.

Outro dia um paciente desavisado insistiu: “Mas Doutor (ignorava que terapeuta não era médico, coitado), minha mãe não me ama, minha namorada me traiu e meu chefe me persegue!”.

Foi transferido de clínica.

Acreditem, os tratamentos seriam muito mais simples. No caso do paciente acima, por exemplo, com relação à questão da mãe, seria fácil: “Mas meu rapaz, sua mãe não está no seu paraíso, para que se preocupar com ela?”, ou então, “Ah, você gostaria que sua mãe fosse diferente, ahã, sei, mas este é um problema dela, não seu. Próxima questão.”, e pronto, todos sãos, todos bem.

Regra número um: pessoas não mudam pessoas, vamos, aceite. Pessoas mudam coisas, mudam de lugar, mudam a si mesmas, dentro de alguns limites, claro. Eu mesma queria muito ser uma borboleta quando pequena mas não deu.

- Mas Elaine, que bobagem, eu mesma mudei muito depois daquele meu primeiro namorado, virei lésbica.

Concordo, é possível conseguirmos provocar mudanças aleatórias em outrem, mas nunca, nunca intencionais.

- Mas a minha mãe me faz sofrer tanto, especialmente quando se nega a fazer suco de melancia para mim.

É, as pessoas não estão aqui para satisfazerem os seus desejos, eu também já sofri muito com isso, mas como não gosto de sofrer passou.

O meu paraíso? Aguardem, em breve postarei, em breve.

Underperformance

Antes de assinar speedy eu até que me contentava com alguma demora no abrir das páginas na internet, agora não. Uma vez que a internet ficou rápida para mim, o meu padrão mudou. Tem coisa mais irritante do que esperar 10 segundos para acessar seu email? Não. Assim é com as pessoas. Você conhece alguém mighty cool e no dia seguinte a pessoa se mostra desinteressante. Irrita. Ou então você vai ler o texto de alguém, e a pessoa insiste em usar palavras difícieis para dizer bobagens. Não dá pra aguentar.

Pessoas inteligentes não saem por ai gritando que são inteligentes. E se o fizerem tudo bem, porque são mesmo inteligentes. Mas não faça isso se você não for, porque mais cedo ou mais tarde vai irritar, a burrice escondida. Não minta sobre si mesmo a não ser que seja pra pior. Ai está a verdadeira gentileza. Pessoas bonitas que apresentam um descuido calculado com a própria aparência. Pessoas bem-humoradas que ignoram as próprias piadas. Se alguém olha com dó para um mendigo, não é uma boa pessoa. As pessoas deveriam tomar mais cuidado para disfarçar suas qualidades. A não ser que tenham charme para fazer o contrário. Agora, vestir ares de bom e depois underperform não dá.

"Pra ter filho tem que..."

Assim como a procriação humana corre solta pelo mundo, tá cheio de gente por ai com o discurso "Pra ter filho tem que ter isso ou aquilo outro, afinal de contas, é uma responsabilidade muito grande...", tá... mas tem que ter o que mesmo? Dinheiro? Bom senso?

Ao ouvir várias das teorias que existem por ai sobre o assunto eu cheguei a uma conclusão: para ter filho tem que SER (ético, bom, culto, whatever u think is better for the world, babe). Eu explico: o que mais se pode ensinar aos filhos senão aquilo que se é e (com sorte) aquilo em que se acredita? Se você acha que seu filho merece privilégios, se fosse prefeito aposto que estaria por ai dando emprego pros parentes... é, nepotismo começa dentro de casa! E por ai vai com relação a outros assuntos importantes como cultura, sexualidade, política, literatura, meio ambiente...

Você quer que as crianças sejam bem educadas? Preocupe-se com os valores dos pais... vixi, ficou mais difícil agora heim...

Licença Poética

Ontem eu assisti a uma entrevista com o então prefeito José Serra, em que o jornalista perguntava desajeitadamente: "... mas Sr. Prefeito, o Sr. prometeu reinteiradas vezes durante a sua campanha que não abandonaria a prefeitura de São Paulo para concorrer a outros cargos políticos, e o Sr. ainda não cumpriu nem a metade do seu mandato..."

Quer saber qual foi a resposta? "Como diria Fernando Pessoa, a batalha vale a pena, quando a alma e o coração não são pequenos..."

É, eu também fiquei perplexa, mas após refletir por alguns minutos, e me certificar de que não estava participando de nenhuma gravação do Zorra Total, eu descartei a hipótese do Serra estar tirando uma com a nossa cara, fazer o que, eu sou uma otimista. Ao invés disso, preferi acreditar que tais palavras de encorajamento servem de consolo aos habitantes de São Paulo que voltarão a ter como líderes prefeito e governador do PFL, antigo partido de Maluf, Pitta, e tantos outros ilustres idiotas. Valeu Serra, eu agradeço pela consideração.

Só espero que a moda não pegue e que os políticos não comecem a fazer citações poéticas ao invés de efetivamente responder às perguntas mais embaraçosas...